sexta-feira, 30 de outubro de 2009

O fim do mundo, cap. 12

Passou-se mais uma semana desde que Claire passou a andar com a gente. Eu estava voltando pra minha sala quando encontro a garota presa em uma roda de gente louca por um pouco de sua atenção e, quem sabe, até um autógrafo ou um pequeno pertence pessoal. Passo por todos de cabeça baixa, tentando chamar a menos atenção possível. Não adiantou nada.
- Ei Max! – chamou Claire, acenando e sorrindo para mim.
Era sempre a mesma ladainha. Ela dava tratamento especial para mim e o resto dos Escolhidos, logo eu, Emily e Ben, que estudávamos na mesma classe que ela, nos tornamos conhecidos e invejados por todos. A garota conseguiu fugir do grupo de fãs e correu até onde eu estava. Me cumprimentou com um beijinho no rosto. Todo dia era a mesma coisa, inclusive o lance com o beijo, o que fazia os garotos que estivessem por perto me encararem com um olhar de pura inveja. E eu, que sempre quis passar despercebido por todos, agora era o centro das atenções. Bem, também eu não tinha de quê reclamar. Os beijos eram suaves e molhadinhos. Dava vontade de nunca mais lavar a bochecha. Sem falar que a garota usava um perfume delicioso.
- Tudo bem? – me perguntou Claire, com o sorriso simpático de sempre.
- Ah... Tudo bem.
Ouvi alguém falar à nossa volta “Quem é esse cara?” e “Por que a Claire dá tanta bola pra ele?”. Bem, acho que isso devia consertar a minha reputação, mas, mesmo assim, nunca gostei de ser o centro das atenções. O sinal bateu e corremos assistir a uma emocionante aula de química da Srta. Smith. Aquilo era um saco. Claire passou a sentar do lado de Emily, uma carteira atrás e na diagonal da minha. Por algum motivo estúpido a pop star passou a bajular a esquisita. Claire conversava a todo o momento com Emily. Não que a esquisita respondesse muito, mas a outra não parecia se importar. Isso rendia algumas repreensões da Srta. Smith. Algo como “Senhorita Campbell, o fato de ser uma estrela adolescente não significa que possa acabar com a ordem em minha aula” e a garota respondia de cabeça baixa e olhar de cachorrinha sem dono: “Perdão, Srta. Smith. Prometo que não irá se repetir”, mas a situação sempre se repetia. Bem, ela não devia se importar muito com a escola. Se eu tivesse a grana que ela ganhava por ano, mandava a escola se danar.
Intervalo. Estávamos nos preparando para o almoço. Claire e Emily conversavam sobre alguma coisa qualquer. A curiosidade me bateu com força.
- Desculpa Claire.
- Sim, Max?
- Por que foi que vc voltou a estudar? Digo, vc deve ganhar bastante dinheiro com a TV, a venda dos teus álbuns, as fotos em revistas e tudo mais. Se eu tivesse o dinheiro que vc tem, jamais voltaria a estudar.
A garota riu do que falei. Qual era a graça?
- Bem... Não foi exatamente esta a minha idéia. É que meu empresário explicou que alguém do juizado de menores podia nos processar caso eu perdesse mais um ano de estudo. Sem falar que eu realmente tava precisando de umas férias e... Sabe? Depois de um ano apenas fazendo shows e gravações, a gente acaba sentindo falta da escola.
- Puxa... Nunca pensei nisso. Dá pra entender – menti. Eu jamais entenderia. Como alguém poderia enjoar de nunca mais ter que ir à escola? Imagina alguém como eu, com o dinheiro dela? Eu trataria de comprar uma rua inteira só pra mim - uma que fosse perfeita para algumas manobras - e passaria o dia inteiro nela, na maior paz e tranqüilidade.
- Com licença Claire – chamou Emily.
- Sim!
- Vc disse que, assim que fizesse parte dos Escolhidos, nos contaria o que quis dizer com aquela história de já conhecer cada um de nós. Já se passou uma semana e vc está sempre por perto da gente, então presumo que já se considere uma Escolhida. Poderia nos explicar, então, o significado daquilo que disse?
Não sei por que Emily tinha que tratar tudo sempre daquele jeitão tão formal. Deu que a Claire sorriu. Um sorriso gentil que só ela sabia dar.
- Ta bem! Eu devo isso à vcs, mas gostaria que a conversa não fosse aqui, dentro do colégio. Tem um parquinho perto daqui. Ta sempre cheio de crianças e os brinquedos são bem coloridos. Eu gosto muito de balanços. O que acham de a gente conversar lá?
Parquinho? E por acaso a gente tinha sete anos? Ela gostava de balanços? Seria possível que eu fosse a única pessoa normal naquele grupo?
- Ta bem. Então, depois da aula vamos ao parquinho. Certo Max? – perguntou Emily.
- Ah, por mim tudo bem.
Saímos em direção ao refeitório. A cada passo, Claire era abordada por um fã diferente. Aquilo era tão idiota. Pra que toda aquela comoção? Digo, é claro que a menina era bonita e gostosa, mas também não era pra tanto. O bicho pega quando a gente cruza no corredor com Whitney e suas seguidoras, com suas bolsinhas de grife e seus saltos de sei lá quantos centímetros, fazendo um barulho absolutamente irritante com suas pulseiras brilhantes.
- Olá Claire, querida. – disse Whitney.
A garota a cumprimenta com a simpatia habitual.
- Olá! Tudo bem?
- Sim, querida. Vc já deve saber quem sou, não é?
- Ah... Lamento. Sou nova no colégio.
As seguidoras trocam olhares surpresos. Como alguém poderia deixar de conhecer Whitney? A líder dá um sorriso amargo de meia boca e diz:
- Eu sou Whitney e o nosso grupo é o mais popular entre os grupos femininos do colégio. Somos desejadas pelos homens e invejadas pelas mulheres. Sabemos andar com estilo, e todos sabem disso. Deixa eu te dar um conselho, querida: tenho um bom faro pra gente refinada como eu, e posso dizer que, nesse colégio, alguém refinada como vc só tem a perder andando com gente como esses dois aí – disse a nojenta, apontando para mim e para Emily.
- Bem, eu...
- É uma ocasião especial. Estamos te convidando a sentar em nossa mesa durante o almoço. É uma oportunidade única. São pouquíssimas as garotas convidadas a fazer parte da nossa recreação. Então vamos?
- Bem, é que...
- O que é? Pode falar, já somos amigas. Precisa ir ao banheiro antes de almoçar? Sinceramente, vc precisa de uma maquiagem mais expressiva. Todos reparam nisso no refeitório, e...
- Não! É que eu já combinei de almoçar com meus amigos aqui. Sinto muito. – disse Claire, com uma mão segurando o braço de Emily e com a outra segurando o meu.
Aquilo foi ótimo. Você tinha que ver a cara da Whitney ao ouvir aquilo. As demais garotas mimadas do grupo ficaram boquiabertas, fofocando entre si. Whitney bufou, empinou o nariz e disse:
- Hum! Não sabe o tipo de oportunidade que está perdendo.
As meninas saíram, todas de nariz empinado, fazendo um barulho absurdo com seus saltos que lembrava uma marcha. Emily apenas observava toda a situação como alguém de fora. Era incrível como ela não era afetada pela opinião alheia.
- Isso mesmo, Claire! Não dá bola pra essas garotas – falei todo empolgado. Ela apenas sorriu.
Continuamos nosso caminho tortuoso até o refeitório, quando somos abordados mais uma vez, só que, desta vez, pelas garotas da torcida, que se aproximam fazendo barulho e falando alto.
- Claire, Claire! Temos uma proposta pra vc!
- Ah! O que é?
- Estamos em busca de uma líder de torcida. Uma de nossas estrelas, a Ashley, acaba de desistir de praticar cheerleading. Precisamos de alguém como vc. É perfeita para o cargo! É bela, popular e tem um sorriso mais simpático ainda que o da antiga cheerleader. O que acha?? Responde!
Várias vozes falavam a mesma coisa ao mesmo tempo pra nossa pobre pop star. Ela nos segura pelo braço e diz, antes de disparar até o refeitório:
- Desculpe. Tenho que pensar no assunto. Prometo que, assim que tiver uma opinião a respeito, vcs ficarão sabendo. Tchau-tchau!
Corremos em direção ao refeitório. Aquilo era realmente muito chato. Devia ser um saco ser uma pop star e ter que dar explicações educadas pra todo mundo. Enfim chegamos ao refeitório. Agora poderíamos almoçar em paz. Aproveitei para perguntar:
- A Ashley desistiu de ser cheerleader? Eu não sabia disso.
- O Ray me falou alguma coisa a respeito. Algo sobre ela não mais querer ser reconhecida apenas pelos seus dotes físicos, mas sim pelos intelectuais. Ouvi dizer, também, que ela venceu a eleição e se tornou a nova presidente do grêmio estudantil. – respondeu Emily.
- Puxa, quem diria...
A Ashley era a nova representante dos alunos perante o núcleo educacional? Aquilo não podia ser coisa boa. Bem, o resto de nosso dia foi razoavelmente normal. Assim que o sino bateu, encontrei as garotas me esperando no portão da escola. Partimos em direção ao tal parquinho. Esperava apenas que ninguém me visse brincando numa balança. Isso seria o fim da minha reputação. Era tarde e o sol já se punha no horizonte, dando aquela coloração típica de cair da tarde que parece deixar o mundo inteiro mais alaranjado. Havia algumas poucas mães cuidando de seus filhos na gangorra e no escorregador. Por sorte, os balanços estavam desocupados, então as garotas sentaram, a Claire em um balanço amarelo e a Emily em um azul.
- Não vai sentar Max? – perguntou Claire.
- Ah, não. Deixa pra lá. To bem em pé.
- E então, Claire, pode nos contar o que quis dizer aquele dia? – perguntou Emily.
- Bem... Eu disse a vcs que sentia que já os conhecia de algum lugar né? Foi assim: já tava tudo certo sobre a minha ausência da mídia por algum tempo. Eu não sabia, exatamente, o que fazer durante essa ausência. Foi quando tive um sonho.
- Sonho? – perguntei. Já repararam que eu sou campeão em fazer perguntas retóricas sem sentido algum? O fato é que eu previa algo que não gostava. Essas coisas subjetivas como os sonhos da Claire e as intuições da Emily sempre me deixaram bastante desconfortável.
- Sim. Era como se eu voltasse a ser criança. Costumo sonhar bastante com a minha infância, mas são sempre sonhos ruins... Fazia muito tempo que não sonhava algo feliz como foi desta vez.
- E como era o sonho? – perguntou Emily.
- Era um parquinho como esse, cheio de brinquedos coloridos e cercado por um bosque muito bonito. Contando comigo, havia, nesse parquinho, nove crianças que brincavam e se divertiam de uma forma muito especial. Essas crianças éramos nós, os Escolhidos.
- Puxa! – comentei – Então eu estava nos seus sonhos mesmo antes de te conhecer?
- Sim! Não só estava como vc, Max, era o líder da brincadeira. Era o mais divertido de todos e o que inventava quais jogos e brincadeiras a gente faria. Lembro claramente de todos os Escolhidos no parquinho. Ray, Jhonny, Ben, Ashley... Estávamos todos lá, mas éramos todos crianças nesse sonho. Não parecia que nos conhecíamos muito bem, mas não nos importávamos com isso.
- E o que mais?
- Ah, bem... A gente brincava de todo o tipo de coisa, desde pega - pega a pique - esconde. Desde jogar bola a pular corda. A gente explorava todos os brinquedos, desde o balanço a gangorra e o escorregador, e rodávamos no carrossel a uma velocidade incrível! Eu sentia um pouco de medo. Era a mais medrosa do grupo e não tinha coragem nem de subir até o final no trepa-trepa, mas vcs todos pareciam querer cuidar de mim... Pareciam querer me divertir. Me senti tão querida... Lembro das brincadeiras, como o pega - pega, em que eu corria como se minha vida dependesse daquilo, e me sufocava em meio a tantos risos. Corria tanto que acordei com o coração disparado e o peito dolorido, mas valeu a pena, pois esse sonho foi uma das coisas mais alegres que já me aconteceu!
Quem diria que a pop star do momento tinha sonhos tão infantis quanto aquele? A garota sorria com o olhar perdido no vazio enquanto contava o sonho de uma forma cheia de ternura. Parecia lembrar de nós com muito carinho. Seria possível que fossemos tão especiais para ela quanto parecia?
- E vc lembra como eram os dois outros? – perguntou Emily.
- Ah... Que outros?
- Os Escolhidos que ainda não encontramos.
- Ah sim! Desculpe. Então... Se não me engano, era um menino e uma menina. Ele era alto, magro, inteligente e conhecia todos os brinquedos como ninguém. Ela... Bem... Não consigo lembrar ao certo como ela era. Lembro apenas que ficava sentada num banquinho afastado, rindo e comentando as brincadeiras.
Emily se levantou do balanço.
- Bem, isso quer dizer que Claire já revelou seu poder secreto.
- O quê?? – perguntei.
- O poder de prever o futuro em sonhos. Será uma habilidade bastante útil, e...
- Bem eu... – interrompeu Claire.
- O que é? – disse Emily.
- Sabe? Eu tenho trabalhado duro nos últimos anos com a TV e a música. Conheci muitas pessoas desde que entrei pra esse ramo e fiz amizades com todo o tipo de gente do mundo do entretenimento, mas foram todas muito superficiais e passageiras. Agora quero fazer amizades verdadeiras, com gente normal como vcs. Amizades sinceras que durem uma vida inteira!
Normais? Nós? Aquilo só podia ser brincadeira.
- E, bem, todo esse lance sobre Escolhidos. Não somos meros amigos. Somos uma espécie de “Aliança Galáctica” que tem como objetivo salvar todos os seres humanos do Mal. Nossa relação é mais que humana: é mágica! Aposto que ainda me divertirei muito e quero que saibam que estou realmente muito feliz por ter conhecido todos vcs!
Quê? "Aliança Galáctica"??? A garota dizia toda aquela baboseira com o maior sorriso angelical no rosto. A Emily apenas sorriu e concordou. Parecia que mais uma estranha entrava para nosso grupo.

Um comentário:

blur disse...

http://cienciahoje.uol.com.br/images/ch%20on-line/colunas/celulas/51328a.jpg

um platelminto :)