quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Crônicas do Mundo 2

~ O Cavaleiro Negro ~

E. e A. encontraram um castelo abandonado em meio ao Jardim. Era um lugar grande e bonito. Decidiram que seriam rei e rainha daquelas ruínas. Esteve tudo bem até A. ser capturada pelo Cavaleiro Negro. Este infeliz era o nêmesis do Príncipe Encantado e gostava, basicamente, de raptar princesas indefesas. Morava num castelo negro cercado por morcegos, lobos, cobras e todo o tipo de bicho assustador.

Aquele castelo era grande demais para E. brincar sozinho. Nosso herói pediu um sabre de luz emprestado a Maitomashin e seguiu para o tal castelo maligno, partindo em várias partes todo e qualquer bicho que entrasse em seu caminho, fazendo ZUM e ZUUM.

O castelo estava cercado por ervas venenosas e plantas gigantes cheias de espinhos. Com seu sabre de luz, E. fez seu caminho por todas as adversidades. Enfim chegou ao salão superior, onde o Cavaleiro Negro tocava um gigantesco órgão tubular de sete andares de tecla, cada andar com umas nove oitavas e mais uma terça. Tocava a Tocata e Fuga em ré menor do Bach. O vilão se levantou, jogou sua capa e disse com uma voz grossa e metálica, abafada pelo elmo fechado:

- E... Venha para o lado negro da força.

Aquilo não fazia sentido nenhum então E. decidiu simplesmente decepar o inimigo sem fazer perguntas. Era uma tarefa dura pois o Cavaleiro Negro tinha um sabre de luz como o de nosso herói. A batalha seguia acirrada. O vilão dizia:

- Sua falta de fé é perturbadora.

E. estava cheio daquele discurso sem sentido e simplesmente decapitou seu rival com um golpe certeiro. Uma porta se abriu para a torre mais alta daquele castelo. Após subir escadas por um bom tempo, E. chegou até seu destino.

Era um quarto elegante num estilo vitoriano com a predominância das cores vermelho e dourado. A. estava mudada. Usava um vestido preto com muitas rendas e detalhes. Usava maquiagens pesadas, deitada em um divã enquanto era servida de vinho e frutas por suas servas. A. estava bela? Estava mais feminina que nunca. A. disse a E:

- Você é realmente irritante. Não vê que ninguém precisa de você aqui? O Cavaleiro Negro é um homem de classe - gentil, elegante, inteligente, refinado e, acima de tudo, maduro. Um homem maduro, ao contrário de você. Não vê que estou cansada das suas brincadeiras? Você perdeu a hora de crescer, E. Nem ao menos sabe o que é o amor. Nem ao menos conhece os prazeres do vinho... Da beleza... Da servidão... Do poder... Do ouro e das jóias...Os prazeres da carne. Tudo em que você pensa é em suas brincadeiras estúpidas. Deixe-me aqui e volte para seu jardim idiota. Seja criança para sempre e morra na ignorância.

Aquela não era a A. que nosso herói conhecia. O que havia acontecido desde o Dia dos Namorados? E. revelou que não havia mais Cavaleiro Negro. Que o havia decapitado. A. ficou desesperada. Chorava como uma criança, manchando o rosto com a maquiagem e implorando por seu amante, pai, protetor... Homem maduro. E. achava aquela choração toda uma chatice. Teve tanta raiva que, com apenas um olhar furioso, tratou de queimar as madeixas encaracoladas de A. Agora sim aquela menina idiota teria porque chorar. Não era ela quem falava em poder? Pois bem, os olhos de E. queimarão os falsos e mentirosos. Aquilo era bom...

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Crônicas do Mundo 2

~ O Tiranossauro ~

E. odiava a escola. Não era por menos – a escola era uma droga. Odiava todo mundo na escola com exceção de A., que não lhe dava mais atenção. Havia um cara... O nome dele era W. Humilhava E. na frente de todos, xingando e fazendo chacotas com sua aparência física e seu comportamento. E. tentou revidar mas era inútil. W. deu de presente a E. um nariz que sangrava.

E. gostava de ficar em casa, desenhando, jogando videogame e brincando sozinho com seus bonecos. Seu favorito era Rex, o tiranossauro de borracha. Era o mais poderoso entre seus brinquedos, e sua boca grande podia engolir a cabeça do Capitão América com uma só bocada.

E. levou Rex para a escola esperando disfarçar a solidão. Além da bronca que levou da professora, também ganhou vaias, chacotas horríveis do pessoal do fundo da sala, comentários jocosos e risos não tão bem escondidos por aquelas meninas nojentas. No recreio, W. tomou Rex de E. e arremessou o brinquedo para o outro lado do muro, num terreno baldio. E. pediu à diretora para sair em busca de seu brinquedo. Levou outra bronca.

Em meio ao terreno, E. encontrou Rex são e salvo, caminhando pelo mato. Perguntou ao dinossauro se não havia se machucado. Rex respondeu com a voz mais maneira que você pode imaginar:

- Há! Esse W. com certeza sabe falar alto, mas arremessa como uma mocinha. Não se preocupe comigo, meu chapa... Ah, o que é isso amigão? Não chore! Este W. não é de nada. Vamos lá campeão! Está melhor? Ótimo, vamos voltar para a escola. Este W. ainda vai levar o que merece...

Rex não só era maneiro, como também era um dinossauro gentil e amigável. Bem... Não com todo mundo. Depois de algumas semanas assistindo seu melhor amigo E. ser alvo de piadas, ameaças e brincadeiras de mau gosto, Rex começou a crescer. Andava sozinho pela escola e estava pesado demais para ser arremessado pro outro lado do muro.

Então, um dia, durante o recreio, W. abaixa as calças de E. em frente a toda a escola. Todos riem, e E. sente vergonha, humilhação e raiva... Muita raiva e o dinossauro cresce. Cresce até ter o tamanho de um tiranossauro de verdade. Assim que percebem o perigo, todos tentam fugir, inclusive W., mas o idiota jamais escaparia do terrível Tiranossauro Rex. Com apenas uma bocada, o dinossauro arranca a cabeça de W. Aquela escola idiota era o novo banquete de Rex. E. teve sua vingança.

sábado, 9 de janeiro de 2010

Crônicas do Mundo 2

~ A Vingança de A. ~

Depois de duas semanas em coma, A. retornou ao Mundo 2. E. estava feliz com o retorno de A, mas a garota não era mais a mesma. Muito havia ficado preso no espelho. E. não se aproximou – não por A, mas por quem a acompanhava. A. retornou acompanhada de um gigante de seis braços e três olhos. Era um deus terrível. A. levou o deus até a casa, apontou a entrada para o forro e disse:

- É aqui que se esconde o monstro, Senhor Shiva. Por favor, faça-o sofrer e traga-me a cabeça do infeliz.

O gigante respondeu com voz de trovão:

- Receio que isto não seja possível, mortal. Se a Shákti de Brahma estiver mesmo prisioneira deste monstro, terei que reduzi-lo a cinzas.

O Mahadeva subiu até o forro e E. pode ouvir os gritos de dor e desespero do Bicho-Papão. A. teve sua vingança. A. sempre tem tudo o que quer.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Crônicas do Mundo 2

~ O Devorador de Crianças ~

Assim que E. chegou, A. mostrou ao amigo os restos mortais do coelhinho. Aquele mesmo com que E. a havia presenteado. O Bicho-Papão havia comido o coitadinho e deixado apenas os ossos e uns restos de vísceras. A. queria vingança e a teria com a ajuda de E.

Assim que todos foram dormir, A. e E. tomaram a escada dos pintores mais uma vez e subiram para o forro (aquele mesmo onde encontraram o Papai-Noel). E. levava seu taco de beisebol e uma lanterna enquanto A. levava uma faca da cozinha. A garota estava determinada em fazer o maldito Bicho-Papão sangrar.

De fato, o monstro se escondia lá, devorando animaizinhos pequenos que caçava pelas redondezas, como gatinhos, passarinhos e cachorrinhos. O Bicho era realmente grande – dava uns dois adultos – e tinha uma boca enorme. Assim que viu as crianças, riu fazendo uns barulhos engraçados e falou:

- BlaH BOuoO Goy bLLARg YuoOoaA HuuoOrR BllEEArgH.*

Nossos heróis não sabiam falar a língua dos monstros, então não puderam entender nada do que o Bicho disse. Depois do discurso, o monstro tirou da boca uma pequena caixinha de música, deu corda e a soltou no chão. Uma musiquinha de ninar saia da caixa. O Bicho-Papão disse:

- BlEEeeE BuuEOeoeO GooOBLIa WuuUu BlaH wBoooBb.*

E antes que pudessem agir, nossos heróis sentiram um sono profundo. Não resistiram ao peso das pálpebras e se entregaram à magia daquela caixinha de música. Quando acordou, E. percebeu que havia algo errado. Ligou a lanterna, mas que lugar era aquele? Ele e A. estavam juntos, apertados e entalados em algo que parecia ser um buraco fino ou um tubo macio. A. ainda estava sob o feitiço e dormia profundamente, lambuzada em um liquido estranho. Era o que E. temia: estavam no esôfago do Bicho-Papão, e sabia que, se não saíssem de lá logo, cairiam no estômago onde seriam digeridos. Tentou se debater, mas aquele lugar era apertado e mal deixava nosso herói se mexer. Tentou despertar A., mas era inútil. Depois de muito esforço por parte de E., o Bicho sentiu a comida incomodar e uma voz se propagou como se viesse de todos os lugares:

- WaahhrG GroOO BllaAAhrg GrRRooO ssSSSWOorp PooOObB.*

De repente, o esôfago começou a fazer contrações que empurravam nossos heróis para baixo. E. tentou se segurar mas as paredes eram lisas e escorregadias. Em pouco tempo, caíram no estômago. Os sucos digestivos começaram a vazar de todos os lados. Era um liquido quente que queimava a pele de E. O menino resolveu forçar seu retorno, mais uma vez. Outra viagem ruim ao Mundo 2.

E. logo perceberia que não devia ter deixado A. inconsciente numa situação como aquela, na qual deviam se desconectar o mais cedo possível. O Mundo 2 era belo, mas cruel.
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* Olhem só o que o Pequeno Príncipe acaba de encontrar: crianças belas e rosadas! Há quanto tempo este Príncipe não come crianças de verdade? Parecem deliciosas!

* Querida Sarasvati, prisioneira na caixa deste Príncipe. Cante para estas crianças más para que durmam e sejam boazinhas durante o desjejum deste Príncipe.

* Crianças más! Durmam e esperem pela digestão deste Príncipe. Sejam crianças obedientes.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Oceano

http://www.youtube.com/watch?v=FHgyZFiUPeM

O fim do mundo, cap. 17

Era domingo. A gente faria uma reunião no galpão do velho McCain. Deixa eu te explicar como ficou essa história: após o discurso da Emily, o velho maluco resolveu nos ajudar, mas não nos emprestou a casa. Atrás do terreno havia um galpão velho que era usado pra estocar móveis antigos, e o velho decidiu que seria melhor que fizéssemos nossa base lá. Foi até melhor, pois o lugar era mais isolado. Foi um dia bem estranho. Depois de tudo o velho fez até biscoitos pra gente.
O fato é que, enquanto eu, Emily e Claire íamos para o Q.G. (era assim que Emily chamava o galpão do velho McCain), passamos por uma quadra velha de basquete, coberta por uma cerca. No meio desta quadra estavam Ben e Johnny praticando as tais aulas de autodefesa. Paramos para assistir. As garotasse encostaram à grade. Preferi manter uma certa distância, mas observei tudo. Torcia para que acabasse numa briga emocionante.
- Será que vai dar tudo certo? – perguntou Claire.
- Não sei – respondeu Emily.
- Digo, não há perigo de os garotos se machucarem?
- Não sei.
- Ah Claire, não esquenta com isso. É isso que eles querem fazer não é? Deixe que se machuquem – disse eu. De fato, eu queria mais é que os dois saíssem no braço. Seria algo bastante emocionante praquela tarde tediosa de domingo.
As garotas estavam de mãos dadas. Claire fazia questão de manter uma proximidade de nós, os demais Escolhidos, e isso incluía uma proximidade física, mas com a Emily ela investia pesado no toque. Estavam sempre de mãos dadas ou braços enganchados ou abraçando-se. A Emily era sempre indiferente, mas Claire não parecia se importar muito com isso. Ela segurava a mão de Emily com uma das suas e com a outra segurava a grade. Parecia mesmo preocupada com a situação dos idiotas.
- Ok garoto, vamos voltar para o básico. Por que é que a humanidade briga entre si desde o começo dos tempos? – perguntou Johnny com uma mão na cintura e a outra segurando sua jaqueta de couro no ombro.
- Sei lá. O que isso tem a ver com autodefesa? – Pow! O gordo levou outro daqueles tapas na cabeça.
- Ai! Qual é a tua? – reclamou Ben.
- Droga carinha, já te disse que isso é pra te dar inspiração! Escuta: a gente briga pra aliviar a tensão. Isso mesmo, não há nada que te deixe mais relaxado que uma boa briga. E tem mais, quando digo brigar não quero dizer bater. Digo apenas brigar, entende? Na maioria das vezes, levar uma bela surra te deixa bem mais relaxado que bater em alguém.
Ben encarou o mestre de forma curiosa.
- Se apanhar é melhor que surrar, por que vc ta me ensinando essa droga de autodefesa? – Pow! O gordo levou outro tapa na cabeça. Não entendi por que. O gordo tava certo. Aquilo não fazia sentido nenhum e eu teria perguntado a mesma coisa.
- Não garoto! Não pense assim. Droga, vc é lento... Não entende? Vc não pode passar o resto da vida evitando as brigas, muito menos se entregando a qualquer valentão que queira te bater. O esquema é revidar, mesmo que a briga esteja perdida. Mesmo que vc não tenha a mínima chance de vencer. Quando vc sabe que apanhar, muitas vezes, é melhor que bater, vc sente que não tem nada a perder e ganha confiança. Tendo confiança vc nem ao menos precisa brigar, basta demonstrar coragem e ameaçar os desgraçados. Acha mesmo que eu venceria aquela briga com Budd e sua turma? É muito difícil ganhar uma briga de três contra um, mas o segredo está em não deixar que teus adversários saibam que vc sabe disso, entende?
Ben escutava com atenção. Nesse momento o conversível de Ray estaciona ao nosso lado. O cara tava com a Ashley. O casal perfeito desembarcou e foi ter com a gente.
- E ai gente, o que é que ta rolando? – perguntou Ray sorridente.
- Ah... O Johnny ta dando umas aulas de autodefesa pro Ben, mas até agora só tão conversando. Ta chato pra caramba – respondi.
- É mesmo? Puxa, o Johnny preparou até uma aula teórica! Essa eu não posso perder – e Ray encostou-se à grade, ao lado das garotas, com uma expressão de curiosidade e animação. Ashley permaneceu ao meu lado, de braços cruzados e uma expressão de desprezo. Qual é o tipo de cara que se anima com aulas teóricas de autodefesa? Vai saber. Mantive a mesma distância dos primeiros momentos e voltei a assistir à aula.
- Mas e se a ameaça não funcionar? – perguntou Ben.
- Aí é que ta o segredo! Se vc não se importar em apanhar, vc também não terá nada a perder. E como eu disse, levar uma surra e ficar com o corpo dolorido muitas vezes é bem mais relaxante que bater em alguém.
O gordo pensou.
- Não acredito nisso. Já apanhei varias vezes e nenhuma delas foi legal.
- É porque vc ainda tem medo da dor. Lembre-se sempre que a dor é sua amiga. Mesmo que vc bata nos caras, teus punhos sempre ficaram doendo por causa do impacto com as caras feias dos imbecis. A dor sempre estará ao teu lado. O importante é saber lidar com ela, e saber que ela, unida à força, é que fazem um bom soco ou um bom pontapé.
Ben levantou uma sobrancelha e ficou com cara de “o quê?”. Johnny suspirou, jogou sua jaqueta, levantou o braço com a mão aberta e disse:
- Melhor passar para as aulas práticas. O negócio funcionará da seguinte maneira: vc acerta um soco na minha mão, com toda a força, depois eu acerto um na tua. A gente vai repetir isso até vc superar o medo da dor.
- Pare de falar isso. Eu não tenho medo da dor!
- Então o que te segura na hora de revidar os socos de Budd Tysel?
O gordo baixou a cabeça. Falou do jeito entrecortado de sempre:
- Não é da tua conta.
Johnny suspira mais uma vez.
- Vai logo carinha. Acerta o soco.
Pow. Ben acertou um soco de leve que mal estalou. Johnny apenas fez um “tsc tsc”.
- Agora é minha vez. Abre tua mão.
- Ei, eu não quero! A idéia foi tua.
- Deixa de ser fresco e abre a mão! Depois que perceber que eu não to pra brincadeira, aposto que se sentirá muito mais a vontade pra me bater.
E Ben levou o soco. POW! O gordo se apressou em gemer e chacoalhar a mão.
- Ai! O que deu em vc?
- Não esquenta garoto. A mão com que vc bate é a outra. Vai lá, agora desconta toda a dor que eu te fiz passar nessa palma aqui – disse Johnny levantando a mão.
- Droga, eu não quero. Me deixe em paz.
- Vamos! Eu não acabei de te acertar um soco? É teu direito. Vai lá, me acerta. Qual é, ainda com medo da dor?
O gordo bufou. Parecia bastante revoltado com essa história.
- Já disse que não tenho medo da dor! Eu só... Eu só não quero machucar ninguém.
Silêncio. Johnny coçou a nuca, suspirou mais uma vez e disse:
- Olha carinha, eu entendo que não goste de machucar as pessoas, mas tem vezes que é preciso escolher quem é que vai se machucar entende? Serão os idiotas que machucarão vc ou será vc que machucará os idiotas? O problema, garoto, é que eu nunca conheci um cara com menos amor próprio que vc. Sabe do que vc precisa? Encontrar alguém por quem lutar.
Ben encarou o mestre com cara de dúvida. Johnny continuou:
- Aposto que vc já se apaixonou por uma garota né? Todo mundo se apaixona uma hora ou outra. Pense que eu sou Budd Tysel e que estou fazendo a tua garota chorar. Consegue visualizar a cena?
Nessa hora Ben olhou para nossa direção. Parece olhar fixamente para um de nós. Será que a paixão dele era uma das garotas? Só sei que, por um momento, tive a impressão que o cara olhou pra mim. Sai azar!
- Vai Ben, isso mesmo. O safado do Budd Tysel ta magoando a tua garota. Ela nunca mais vai sorrir do mesmo jeito que sorria pra vc. E aí, vai deixar barato? Olha o rosto de Budd, aqui, bem na palma de minha mão. Ta vendo? – insinuava Johnny.
O cara sabia mesmo criar o ambiente certo pra despertar a ira contida em potencial nos outros. De repente, Ben franziu as sobrancelhas, puxou o braço com violência e POW! Bem no meio da palma de Johnny. Além do barulho do soco, ouvimos outro barulho característico. Aquilo não podia dar certo. Era um CLACK! Nessa hora, Johnny segura o pulso acertado com a mão, põe entre as pernas, se joga no chão e começa a se contrair e a se debater gritando:
- Ai! Seu safado! O que deu em vc?! Vc quebrou meu pulso! Seu babaca! Ai, ai, ai, filho da mãe... Nunca senti uma dor assim...
Esta sim foi uma situação idiota. O gordo apenas observava Johnny rolar no chão com uma cara de “o que foi que eu fiz?”. Claire puxou Emily para dentro da quadra e foi socorrer o infeliz. Olhei pro Ray, esperando sua reação ao acontecimento. O cara só sorria boquiaberto de um jeito idiota e dizia:
- O Johnny é um gênio!
Emily estava satisfeita, pois descobriu que a habilidade especial do Ben era a super-força. Por que o idiota nunca revelou a droga do poder quando a gente realmente precisou dele? Falando nisso, assim que vi Johnny se debatendo de dor, lembrei de algo antigo da minha infância. Algo de quando eu costumava ir na casa do Ben. Como já falei, sempre rolava umas festinhas horríveis naquela casa. Lembro de um bando de crianças fazendo chacotas com um Ben gorducho, baixinho e com um chapeuzinho de festa ridículo. Se é que eu podia lembrar bem, o gordo era uma máquina assassina e arrebentava as caras de todo mundo na festa. Não sobrava ninguém pra contar história. Foi assim até que um menino foi pro hospital, e uma mãe chorava desesperada, gritando pra Senhora Watschosk: “seu filho é um monstro!”. Que lembrança mais aleatória! É aquele tipo de coisa da infância que fica meio esquecida em alguma parte qualquer do cérebro.
Após o ocorrido, carregamos Johnny até o carro de Ray e o levamos ao hospital. Não chegou mesmo a quebrar o pulso, mas o cara teria que usar gesso por uns dias. Depois de tudo Ray levou cada um de nós para suas respectivas casas e a reunião no McCain foi abortada. O problema (que percebemos só no outro dia) é que ninguém lembrou de avisar o cara novo, o Dwight, sobre o cancelamento da reunião, e o bobalhão ficou esperando na frente da casa do velho por horas. Não seria a ultima vez que faríamos algo assim pro coitado do Dwight.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Crônicas do Mundo 2

~ O Espelho ~

Após escrever todos os seus segredos, A. guardou seu diário na gaveta. Olhou-se no espelho e se pôs a pensar nas coisas que havia acabado de escrever. Coisas secretas sobre E., o novo namorado de sua melhor amiga J. Procurando entendê-las, A. encarava seu reflexo no espelho. Tocou o vidro gelado com a mão direita, e o reflexo sorriu, apertou a mão de A. e a puxou para dentro do espelho.

A. estava, agora, em um labirinto de espelhos. Entre muitas imagens de si mesma, viu aquele reflexo – aquela outra A. que a trouxe para aquele lugar – com o diário nas mãos. Em que momento poderia, ela, ter tirado aquele caderno da gaveta? A outra A. disse:

- Eu sei seus segredos. Vou contá-los todos a J. e E.

A notícia deixou A. desesperada. Correu atrás da outra A., mas esta se confundia com os vários outros reflexos que se projetavam nas paredes de cada novo corredor daquele labirinto. A. correu, correu, correu, até que voltou para o início. Do outro lado do espelho, a garota podia ver seu quarto, e a outra A. com o diário em mãos, que ria histericamente e dizia:

- Olhe só para você. É patética. Estou cansada de ser o seu reflexo. A partir de hoje eu serei a verdadeira A. e você será o meu reflexo. Ao contrário de você, eu posso conquistar o amor de E. Agora espere aqui e não se preocupe, quando voltar, contarei todos os meus segredos a você, exatamente como costumava fazer comigo. Ah! Lembre-se: quando eu sorrir, você deve sorrir também. É para isso que servem os reflexos, não é?

Agora a garota via apenas seu quarto além do vidro frio. A outra A. fora em busca do amor de E. A pobre menina tentava quebrar o vidro, mas era impossível. Havia se tornado um mero reflexo. A. passaria o resto da vida naquele labirinto, cercada de imagens de si mesma.

Quando despertou, A. percebeu que não estava sozinha. Nunca esteve. Havia outra naquele corpo.