terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O fim do mundo, cap. 15

Ben e eu estávamos em uma enrascada. E das grandes.
- Watchosk! Carter! Eu sei que estão por aí! Apareçam, seus maricas! – gritou Budd Tysel do meio do pátio de nossa escola.
- Vcs podem fugir, mas não podem se esconder, ehehe – falou Spike, o louro fanfarrão.
- Não é o contrário? Digo: “Vcs podem se esconder, mas não podem fugir”? Por que, tipo assim, os caras já se esconderam – corrigiu Billie Joe.
- Calem a boca, idiotas, e procurem os frangotes! – urrou Budd para seus comparsas.
Tudo começou quando, acidentalmente, Ben e eu nos deparamos com os valentões durante o intervalo. A gente não pagava a taxa de segurança desde que nos tornamos Escolhidos, e Budd não gostava nada disso. O cara deixou claro: na saída da aula, ou a gente pagava os cinco meses atrasados – e com juros – ou a gente levaria a maior surra de nossas vidas. Eu não tava inclinado a nenhuma destas alternativas, então peguei Ben e decidi me esconder atrás do ginásio. O problema é que o gordo, como o bom gordo que era, se atrasou na hora da corrida até o esconderijo, o que fez com que Spike pudesse perceber um vulto se refugiando atrás do ginásio. Nesse momento, os caras se dirigiam até onde estávamos. Era nosso fim.
- Viu, gordo?! Se vc não corresse feito uma velha, a gente podia ter escapado ileso! – reclamei, sussurrando.
Ben não respondia. Só suava como um porco ofegante devido à corrida e observava a situação. Continuei:
- E agora, o que a gente vai fazer? Droga, o que deu em mim? Por que foi que eu te trouxe comigo? Eu já podia ter pulado a cerca e, neste momento, estaria fazendo algumas manobras com meu skate, mas não! Eu tinha que tentar salvar a tua pele também! Agora vamos apanhar juntos! Ótimo, não é, Ben?
O gordo apenas olhava para baixo, pensativo. Ainda ofegando ruidosamente, claro.
- Eu sei que estão aí, atrás do ginásio. Saiam logo, ou iremos nós até aí! – gritou Budd. Aquilo era terrível. Eu continuava a dar sermão no Ben, até que ele, de repente, falou:
- Max, corre pra longe daqui. Eu atraso os caras.
- O quê???
Após falar isso, Ben saiu lentamente de nosso esconderijo. O gordo só podia ter ficado maluco. Bem, era melhor para mim. Agora bastava correr até o fim do beco e pular a cerca de sempre. Os caras iriam levar um bom tempo aplicando o cuecão no Ben (se é que os caras, desta vez, se limitariam a isso), então eu estava a salvo. Eu estava livre para fugir. Era bem o meu feitio fugir numa hora dessas, mas algo me fez permanecer lá, escondido. É claro que eu não iria pular para fora daquele cantinho atrás do ginásio por nada nesse mundo, mas eu quis, desesperadamente, saber o que aconteceria com o gordo. Talvez fosse só curiosidade. Talvez eu quisesse apenas ver uma briga. Ou talvez...
- Olha só o que temos por aqui! Watchosk, seu filho da mãe! Cadê o Carter? – perguntou Budd enquanto ele e seus capangas se aproximavam lentamente do pobre gordo, formando um circulo em volta dele pra que não pudesse fugir.
- O Max já foi embora. Deixem ele fora da jogada. Sou eu que vcs querem. Podem me bater. Eu não me importo.
Aquele gordo devia ter um parafuso a menos pra não se importar em levar uma bela surra e mais um cuecão pra finalizar. Por que é que ele sempre tentava bancar o durão? Budd fez uma cara de poucos amigos ao ouvir o que Ben falou. Pegou-o pelo colarinho e disse:
- Não desta vez, Watchosk. Acha mesmo que te bater vai anular cinco meses de atraso no pagamento da taxa? Mesmo se anulasse, acha mesmo que anulará, também, os cinco meses de atraso do Carter? A gente vai te bater, sim, mas a dívida continua a mesma. Além do mais, tem uma coisinha que o teu amiguinho precisa explicar melhor pra gente.
Aquilo não me cheirava bem. Tratei de me esconder melhor e continuei a ouvir.
- Dizem por aí que o Carter ta montando uma gangue barra pesada. Uns caras que se reúnem na casa abandonada do velho McCain pra fazer rituais de magia negra, brincadeiras de invocação com copos, canetas e essas coisas idiotas. Quem aquele perdedor pensa que é? Montando uma gangue na MINHA escola, bem debaixo do meu nariz?! O idiota precisa aprender uma lição. Quem manda nessa escola sou eu! – gritou o bully dando de dedo na cara do Ben. Por que é que sempre sobrava pra mim? E qual era a daqueles boatos idiotas? Rituais de magia negra? Agora eu tava mesmo ferrado. De repente, POW! O Budd acertou um soco bem na cara do Ben. O golpe fez um barulho absurdo que doeu até em mim. O gordo caiu todo torto no chão.
- Ei Budd, vamos dar um cuecão nele! – falou Billie Joe.
- Não. Desta vez o negócio vai ser diferente. Vamos acabar com esse gordo – Budd parecia sério. Pensei duas vezes e conclui que era melhor dar o fora daquele lugar o quanto antes. Os caras logo iam acabar com a raça do Bem e, fosse o que fosse que me manteve ali até aquele momento, não me mantinha mais. Levar um soco como aquele de graça? Sem chance!
Eis que, quando eu já estava com as mãos na grade, pronto pra fugir, escuto um barulho violento e abafado. Os valentões ficam em silêncio. Apontei até a borda do ginásio pra ver o que era: Johnny acabava de chegar, e o barulho se tratava de um soco que o mesmo acabava de acertar na parede. O cara tava com um cigarro na boca (em meio ao pátio da escola!). Budd e seus amigos mudaram de expressão de uma hora para a outra; de arrogantes a assustados. Johnny, calmamente, toma seu cigarro da boca, larga no chão, pisa e amassa devagar. Olha mais uma vez pros fanfarrões e diz com toda a calma do mundo:
- Sabem? Eu adoro uma boa briga. Boa briga é briga justa. Já me meti em tanta briga que nem lembro mais. E sabem o que eu mais odeio? Idiotas covardes como vc, Budd Tysel, que precisa de gangue pra bater em gente mais nova. Seu bando de perdedores filhos da mãe!
Nessa hora, Johnny se exalta e dá uma cuspida no chão, olhando para os vilões. Aquilo era um insulto muito sério. Budd e seus comparsas observavam boquiabertos. Johnny continua:
- E sabe do que mais? Valentões como vcs são, normalmente, o que eu como no jantar – Johnny tira a jaqueta de couro com muita calma. Joga-a para o canto, ergue os pulsos e aponta suas mãos fechadas para os fanfarrões – Quem é o primeiro? Ou melhor, por que não vêm os três juntos? Pra mim não faz diferença nenhuma. O diretor vive dizendo que eu sou um inútil. Pra provar o contrário, vou limpar o chão deste pátio com suas caras feias. Aposto que todo mundo da escola vai ficar muito feliz com isso. Vamos! Podem vir!
Os valentões trocam olhares duvidosos.
- Não temos medo de vc, Johnny Jones. Este colégio é nosso! O que estão esperando, seus babacas. Peguem ele! – gritou Budd para seus capangas. Spike foi o primeiro a responder:
- Vc ta brincando?? Vc não viu o que dizem por ai? Dizem que Johnny Jones trás sempre consigo um canivete ou até mesmo uma arma de fogo! Nem sonhando! O cara é osso duro!
- É. Dizem até que ele já matou um cara. Bate nele vc que é o líder – diz Billie Joe.
- Eu vou é dar o fora daqui! – gritou Spike, já dando as costas e batendo em retirada.
- Ei, espere por mim! – e Billie Joe seguiu o amigo covarde.
- Droga, seus idiotas! Voltem aqui! – ordenou Budd, mas sem chances daquilo acontecer.
De repente, era apenas Budd e Johnny. Aquela, sem duvida, seria uma briga espetacular! Melhor ainda que Johnny e Ray. Ainda bem que não fugi. Infelizmente, a briga não aconteceu. Budd disse:
- Desta vez passa. Mas fique sabendo, Johnny Jones: eu sei que vc saiu dos Caveiras. Não sei o que dá num cara pra sair da gangue mais temida da cidade. Só sei que o teu reinado acabou no momento em que deixou a gangue. Teu tempo já era. Agora, o dono desta escola sou eu, Budd Tysel! E da próxima vez a gente vai acertar as contas – e correu atrás de seus comparsas. Quem diria que Johnny era tão durão assim? Se eles soubessem da reação do cara na casa do velho McCain...
Johnny foi até Ben e estendeu a mão. O gordo virou a cara e disse:
- Eu não precisava da tua ajuda.
- Droga, garoto, o que deu em vc? Seu covarde! Por que não reagiu? Eles iam te bater de qualquer jeito – perguntou Johnny furioso.
Ben olhava apenas para o chão. Limpou o sangue que escorria pela boca com a manga da blusa e disse:
- Não é da tua conta.
Nesta hora, Johnny ergueu o punho violentamente como se fosse acertar um soco no coitado, que só fechou os olhos e virou a cara. Foi uma situação bem parecida com aquela vez, quando conhecemos Johnny. É claro que não rolou soco nenhum. Johnny apenas ameaçou pra ver a reação do Ben.
- Escuta garoto: eu sei que vc não quer brigar com ninguém, mas não é a gente que escolhe essas coisas. Às vezes, a gente precisa brigar pra ganhar respeito e evitar uma porção de outras brigas.
Ben abriu um dos olhos para se certificar de que saíra ileso do soco de Johnny.
- E daí? Não me importo – respondeu Ben de forma brusca, mas quase sussurrada. O cara era corajoso mesmo. Quase levou um soco do Johnny e agora bancava o durão. Se fosse eu, concordaria automaticamente com toda aquela lição de moral do Johnny só pra que acabasse mais rápido. É sempre assim que eu lido com broncas dos meus pais. O importante é encurtar o incomodo, por que acabar com ele, na maioria das vezes, incomoda ainda mais. Johnny acertou um tapa na cabeça do Ben. Nada muito sério. Só um tapa.
- Ai! Qual é a tua?
- Olha só, garoto, eu vi o que vc fez. Eu sei que o Max ta escondido ali. Vi que vc ia se sacrificar pra poupar o teu amigo. Isso é legal, mas eu não posso deixar que um cara que tem andado comigo seja zoado por um bando de perdedores como Budd Tysel e sua turma. Isso acabaria com a minha reputação, entende?
E eu que pensei estar bem escondido? Por via das dúvidas, preferi continuar ali, seguro em meu esconderijo.
- Ei Max, não ouviu? Pode sair daí. O idiota já foi embora! – gritou Johnny olhando para minha direção. Que porcaria de esconderijo era aquele! Sai com minha habitual cara de idiota.
- O negócio é o seguinte, galera: a Emily me pediu pra lembrá-los de que hoje é terça feira, ou seja, o dia da reunião semanal dos Escolhidos no galpão do McCain. Isso é um saco. Por que a Emily não sossega um pouco? Bem, de qualquer jeito, será uma boa oportunidade para nossas aulas, não acha, carinha? – Johnny olhou para Ben com um sorriso de meia boca. O gordo apenas fazia uma cara idiota de “Aulas? Do que é que vc ta falando?”.
- Isso mesmo. Aulas de autodefesa! Ah, qual é. Não me olhe com essa cara de criança gordinha que não ganhou chocolate. Vai ser importante pra vc. E se, na próxima vez, eu não estiver por perto? Quem vai proteger o Max? De qualquer jeito, é melhor que seja vc. O Max não tem cara de ser bom de briga, ahuahua.
Apenas fiquei em silêncio. Claro, vamos todos zoar o Max! Aquele dia foi uma droga. Nem ao menos pude assistir a briga entre Johnny e Budd! Eu não podia imaginar, mas ainda veria brigas muito mais emocionantes que esta. Aquela história não tava nem na metade.

Nenhum comentário: