terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O fim do mundo, cap. 15

Ben e eu estávamos em uma enrascada. E das grandes.
- Watchosk! Carter! Eu sei que estão por aí! Apareçam, seus maricas! – gritou Budd Tysel do meio do pátio de nossa escola.
- Vcs podem fugir, mas não podem se esconder, ehehe – falou Spike, o louro fanfarrão.
- Não é o contrário? Digo: “Vcs podem se esconder, mas não podem fugir”? Por que, tipo assim, os caras já se esconderam – corrigiu Billie Joe.
- Calem a boca, idiotas, e procurem os frangotes! – urrou Budd para seus comparsas.
Tudo começou quando, acidentalmente, Ben e eu nos deparamos com os valentões durante o intervalo. A gente não pagava a taxa de segurança desde que nos tornamos Escolhidos, e Budd não gostava nada disso. O cara deixou claro: na saída da aula, ou a gente pagava os cinco meses atrasados – e com juros – ou a gente levaria a maior surra de nossas vidas. Eu não tava inclinado a nenhuma destas alternativas, então peguei Ben e decidi me esconder atrás do ginásio. O problema é que o gordo, como o bom gordo que era, se atrasou na hora da corrida até o esconderijo, o que fez com que Spike pudesse perceber um vulto se refugiando atrás do ginásio. Nesse momento, os caras se dirigiam até onde estávamos. Era nosso fim.
- Viu, gordo?! Se vc não corresse feito uma velha, a gente podia ter escapado ileso! – reclamei, sussurrando.
Ben não respondia. Só suava como um porco ofegante devido à corrida e observava a situação. Continuei:
- E agora, o que a gente vai fazer? Droga, o que deu em mim? Por que foi que eu te trouxe comigo? Eu já podia ter pulado a cerca e, neste momento, estaria fazendo algumas manobras com meu skate, mas não! Eu tinha que tentar salvar a tua pele também! Agora vamos apanhar juntos! Ótimo, não é, Ben?
O gordo apenas olhava para baixo, pensativo. Ainda ofegando ruidosamente, claro.
- Eu sei que estão aí, atrás do ginásio. Saiam logo, ou iremos nós até aí! – gritou Budd. Aquilo era terrível. Eu continuava a dar sermão no Ben, até que ele, de repente, falou:
- Max, corre pra longe daqui. Eu atraso os caras.
- O quê???
Após falar isso, Ben saiu lentamente de nosso esconderijo. O gordo só podia ter ficado maluco. Bem, era melhor para mim. Agora bastava correr até o fim do beco e pular a cerca de sempre. Os caras iriam levar um bom tempo aplicando o cuecão no Ben (se é que os caras, desta vez, se limitariam a isso), então eu estava a salvo. Eu estava livre para fugir. Era bem o meu feitio fugir numa hora dessas, mas algo me fez permanecer lá, escondido. É claro que eu não iria pular para fora daquele cantinho atrás do ginásio por nada nesse mundo, mas eu quis, desesperadamente, saber o que aconteceria com o gordo. Talvez fosse só curiosidade. Talvez eu quisesse apenas ver uma briga. Ou talvez...
- Olha só o que temos por aqui! Watchosk, seu filho da mãe! Cadê o Carter? – perguntou Budd enquanto ele e seus capangas se aproximavam lentamente do pobre gordo, formando um circulo em volta dele pra que não pudesse fugir.
- O Max já foi embora. Deixem ele fora da jogada. Sou eu que vcs querem. Podem me bater. Eu não me importo.
Aquele gordo devia ter um parafuso a menos pra não se importar em levar uma bela surra e mais um cuecão pra finalizar. Por que é que ele sempre tentava bancar o durão? Budd fez uma cara de poucos amigos ao ouvir o que Ben falou. Pegou-o pelo colarinho e disse:
- Não desta vez, Watchosk. Acha mesmo que te bater vai anular cinco meses de atraso no pagamento da taxa? Mesmo se anulasse, acha mesmo que anulará, também, os cinco meses de atraso do Carter? A gente vai te bater, sim, mas a dívida continua a mesma. Além do mais, tem uma coisinha que o teu amiguinho precisa explicar melhor pra gente.
Aquilo não me cheirava bem. Tratei de me esconder melhor e continuei a ouvir.
- Dizem por aí que o Carter ta montando uma gangue barra pesada. Uns caras que se reúnem na casa abandonada do velho McCain pra fazer rituais de magia negra, brincadeiras de invocação com copos, canetas e essas coisas idiotas. Quem aquele perdedor pensa que é? Montando uma gangue na MINHA escola, bem debaixo do meu nariz?! O idiota precisa aprender uma lição. Quem manda nessa escola sou eu! – gritou o bully dando de dedo na cara do Ben. Por que é que sempre sobrava pra mim? E qual era a daqueles boatos idiotas? Rituais de magia negra? Agora eu tava mesmo ferrado. De repente, POW! O Budd acertou um soco bem na cara do Ben. O golpe fez um barulho absurdo que doeu até em mim. O gordo caiu todo torto no chão.
- Ei Budd, vamos dar um cuecão nele! – falou Billie Joe.
- Não. Desta vez o negócio vai ser diferente. Vamos acabar com esse gordo – Budd parecia sério. Pensei duas vezes e conclui que era melhor dar o fora daquele lugar o quanto antes. Os caras logo iam acabar com a raça do Bem e, fosse o que fosse que me manteve ali até aquele momento, não me mantinha mais. Levar um soco como aquele de graça? Sem chance!
Eis que, quando eu já estava com as mãos na grade, pronto pra fugir, escuto um barulho violento e abafado. Os valentões ficam em silêncio. Apontei até a borda do ginásio pra ver o que era: Johnny acabava de chegar, e o barulho se tratava de um soco que o mesmo acabava de acertar na parede. O cara tava com um cigarro na boca (em meio ao pátio da escola!). Budd e seus amigos mudaram de expressão de uma hora para a outra; de arrogantes a assustados. Johnny, calmamente, toma seu cigarro da boca, larga no chão, pisa e amassa devagar. Olha mais uma vez pros fanfarrões e diz com toda a calma do mundo:
- Sabem? Eu adoro uma boa briga. Boa briga é briga justa. Já me meti em tanta briga que nem lembro mais. E sabem o que eu mais odeio? Idiotas covardes como vc, Budd Tysel, que precisa de gangue pra bater em gente mais nova. Seu bando de perdedores filhos da mãe!
Nessa hora, Johnny se exalta e dá uma cuspida no chão, olhando para os vilões. Aquilo era um insulto muito sério. Budd e seus comparsas observavam boquiabertos. Johnny continua:
- E sabe do que mais? Valentões como vcs são, normalmente, o que eu como no jantar – Johnny tira a jaqueta de couro com muita calma. Joga-a para o canto, ergue os pulsos e aponta suas mãos fechadas para os fanfarrões – Quem é o primeiro? Ou melhor, por que não vêm os três juntos? Pra mim não faz diferença nenhuma. O diretor vive dizendo que eu sou um inútil. Pra provar o contrário, vou limpar o chão deste pátio com suas caras feias. Aposto que todo mundo da escola vai ficar muito feliz com isso. Vamos! Podem vir!
Os valentões trocam olhares duvidosos.
- Não temos medo de vc, Johnny Jones. Este colégio é nosso! O que estão esperando, seus babacas. Peguem ele! – gritou Budd para seus capangas. Spike foi o primeiro a responder:
- Vc ta brincando?? Vc não viu o que dizem por ai? Dizem que Johnny Jones trás sempre consigo um canivete ou até mesmo uma arma de fogo! Nem sonhando! O cara é osso duro!
- É. Dizem até que ele já matou um cara. Bate nele vc que é o líder – diz Billie Joe.
- Eu vou é dar o fora daqui! – gritou Spike, já dando as costas e batendo em retirada.
- Ei, espere por mim! – e Billie Joe seguiu o amigo covarde.
- Droga, seus idiotas! Voltem aqui! – ordenou Budd, mas sem chances daquilo acontecer.
De repente, era apenas Budd e Johnny. Aquela, sem duvida, seria uma briga espetacular! Melhor ainda que Johnny e Ray. Ainda bem que não fugi. Infelizmente, a briga não aconteceu. Budd disse:
- Desta vez passa. Mas fique sabendo, Johnny Jones: eu sei que vc saiu dos Caveiras. Não sei o que dá num cara pra sair da gangue mais temida da cidade. Só sei que o teu reinado acabou no momento em que deixou a gangue. Teu tempo já era. Agora, o dono desta escola sou eu, Budd Tysel! E da próxima vez a gente vai acertar as contas – e correu atrás de seus comparsas. Quem diria que Johnny era tão durão assim? Se eles soubessem da reação do cara na casa do velho McCain...
Johnny foi até Ben e estendeu a mão. O gordo virou a cara e disse:
- Eu não precisava da tua ajuda.
- Droga, garoto, o que deu em vc? Seu covarde! Por que não reagiu? Eles iam te bater de qualquer jeito – perguntou Johnny furioso.
Ben olhava apenas para o chão. Limpou o sangue que escorria pela boca com a manga da blusa e disse:
- Não é da tua conta.
Nesta hora, Johnny ergueu o punho violentamente como se fosse acertar um soco no coitado, que só fechou os olhos e virou a cara. Foi uma situação bem parecida com aquela vez, quando conhecemos Johnny. É claro que não rolou soco nenhum. Johnny apenas ameaçou pra ver a reação do Ben.
- Escuta garoto: eu sei que vc não quer brigar com ninguém, mas não é a gente que escolhe essas coisas. Às vezes, a gente precisa brigar pra ganhar respeito e evitar uma porção de outras brigas.
Ben abriu um dos olhos para se certificar de que saíra ileso do soco de Johnny.
- E daí? Não me importo – respondeu Ben de forma brusca, mas quase sussurrada. O cara era corajoso mesmo. Quase levou um soco do Johnny e agora bancava o durão. Se fosse eu, concordaria automaticamente com toda aquela lição de moral do Johnny só pra que acabasse mais rápido. É sempre assim que eu lido com broncas dos meus pais. O importante é encurtar o incomodo, por que acabar com ele, na maioria das vezes, incomoda ainda mais. Johnny acertou um tapa na cabeça do Ben. Nada muito sério. Só um tapa.
- Ai! Qual é a tua?
- Olha só, garoto, eu vi o que vc fez. Eu sei que o Max ta escondido ali. Vi que vc ia se sacrificar pra poupar o teu amigo. Isso é legal, mas eu não posso deixar que um cara que tem andado comigo seja zoado por um bando de perdedores como Budd Tysel e sua turma. Isso acabaria com a minha reputação, entende?
E eu que pensei estar bem escondido? Por via das dúvidas, preferi continuar ali, seguro em meu esconderijo.
- Ei Max, não ouviu? Pode sair daí. O idiota já foi embora! – gritou Johnny olhando para minha direção. Que porcaria de esconderijo era aquele! Sai com minha habitual cara de idiota.
- O negócio é o seguinte, galera: a Emily me pediu pra lembrá-los de que hoje é terça feira, ou seja, o dia da reunião semanal dos Escolhidos no galpão do McCain. Isso é um saco. Por que a Emily não sossega um pouco? Bem, de qualquer jeito, será uma boa oportunidade para nossas aulas, não acha, carinha? – Johnny olhou para Ben com um sorriso de meia boca. O gordo apenas fazia uma cara idiota de “Aulas? Do que é que vc ta falando?”.
- Isso mesmo. Aulas de autodefesa! Ah, qual é. Não me olhe com essa cara de criança gordinha que não ganhou chocolate. Vai ser importante pra vc. E se, na próxima vez, eu não estiver por perto? Quem vai proteger o Max? De qualquer jeito, é melhor que seja vc. O Max não tem cara de ser bom de briga, ahuahua.
Apenas fiquei em silêncio. Claro, vamos todos zoar o Max! Aquele dia foi uma droga. Nem ao menos pude assistir a briga entre Johnny e Budd! Eu não podia imaginar, mas ainda veria brigas muito mais emocionantes que esta. Aquela história não tava nem na metade.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Schwarzenegger

Uma terra vazia de significado.
Mil significações diferentes = 0
Este sou eu e você também.
Você, daqui,
Sabe o que é estar preso num cubo mágico
Eis a nova linguagem, que como queriam os lingüistas da nova leva
Não diz nada.
Absolutamente nada. E não há nada melhor que isso.
{nós [você (eu) eu] ...}
“Sabe? Não há teoria que supere a solidão” – vã filosofia.
“...”
And you know there’s no meaning at all
E isso conforta teus impulsos estéticos
Mas no fundo, não há pé nem cabeça.
Não há começo nem fim.
Infinito. Isso dói.
Como em teus sonhos, mas na realidade.
: falando nisso, e pensar que eu tive uma porra de sonho com o Schwarzenegger, gordo, fazendo drama.
Isso sim é que não faz sentido nenhum.
Who cares?


G

terça-feira, 17 de novembro de 2009

O fim do mundo, cap. 14

- Droga Emily, é isso que vc chama de base secreta? – perguntou Johnny irritado.
- Desculpa gente, mas acho que não vou com vcs. Esse lugar parece assustador... – comentou Claire.
- Vamos lá gente, vai ser divertido! Pensem que será uma grande aventura. Aposto que é nisso que vc ta pensando, não é, Emily? – perguntou Ray.
- Acho apenas que este pode ser um bom quartel general – respondeu a garota.
- Vcs não tem nada melhor pra fazer do que invadir propriedade alheia? A temporada de provas está quase chegando e vcs, ao invés de estudarem, preferem caçar fantasmas em uma mansão idiota? – protestou Ashley.
Ben apenas observava a discussão.
Era uma tarde ensolarada de sábado. Estávamos em frente ao casarão do velho McCain. Eu fui o primeiro a chegar, seguido de Ben, que morava ali perto, Emily, Ray e Ashley que estavam sempre juntos, Johnny e por última Claire, que veio com o motorista particular que voltaria para buscá-la às seis horas. Tínhamos bastante tempo até anoitecer, mas já havíamos perdido boa parte deste tempo discutindo a situação. Aquilo era um saco, sem falar que tava um calor dos diabos.
- Caso não saibam, o casarão do velho McCain é assombrado. Nem mesmo quando era líder dos Caveiras eu ousava entrar num lugar destes, aliás, ninguém ousava – disse Johnny.
- Ora, deixe de ser ingênuo! Fantasmas não existem – explicou Ashley.
- Talvez, mas prefiro não pagar pra ver. Sabem da história? Tudo começou há dez anos atrás. O velho McCain morava neste casarão com sua esposa. Até que, um dia, o velho descobriu que sua mulher o traía com o leiteiro. Sabendo disso, ele a matou com um cutelo, cortou seu corpo em treze pedaços e os escondeu entre o concreto das novas paredes da casa que estava em reformas. Até hoje ainda se vê manchas em forma dos membros da mulher nas paredes... – contou Johnny com uma voz sufocada e uma cara suspeita.
- Pare Johnny, por favor. Se vc continuar, aí sim que não entro nessa casa de jeito nenhum! – disse a pobre Claire. De fato, assim como naquele sonho, ela era a mais medrosa entre nós.
- Mas não é só isso! – continuou Johnny – Dizem que até hoje o fantasma da mulher do velho McCain vaga pelos cômodos do casarão, vestindo uma longa camisola branca manchada de sangue, lamentado, chorando e procurando seus membros perdidos. – disse Johnny pausadamente, fazendo caretas e se aproximando de Claire lentamente.
- Pára Johnny. Não tem graça! – reclamou a garota fazendo bico e se encolhendo. O fanfarrão apenas riu.
- E o que houve com o velho McCain? Foi preso? – perguntou Emily.
- Esta é a grande questão! O que poderia ter acontecido ao velho McCain? Após a morte da esposa, o velho sumiu misteriosamente. Ninguém sabe se ele foi embora para algum lugar fora do país, a fim de fugir da polícia, ou se sua esposa não teria se vingado, matando-o e espalhando seus membros pelo porão... – disse Johnny fazendo a mesma performance, com pausas e tudo, mas, desta vez, para Emily. Não deu certo. A garota continuou a encará-lo da forma mais indiferente possível.
- Será possível que todos vcs sejam idiotas ao ponto de acreditar numa baboseira destas? Só falta acreditarem também em papai-noel e coelhinho da páscoa – reclamou Ashley ajeitando seus óculos.
- Isso parece ser uma aventura e tanto! Já pensou se a gente encontra fantasmas de verdade, heim Max? – me perguntou Ray todo bobalhão. Aquilo era um tédio.
- Pois é.
- Vc também acredita em fantasmas, Max? – perguntou Claire.
- Sei lá. Nunca pensei a respeito.
- Ora, vamos. Não me diga que até vc acredita em uma coisa dessas? – perguntou Ashley. Apenas dei de ombro. Não entendi o que ela quis dizer com “até vc”. Será que eu, só por ser o terrível líder e planejador de toda aquela palhaçada, não podia acreditar em fantasmas? Também não entendia por que Ashley desconfiava tanto de mim, afinal, quem inventava a maioria das idiotices que fazíamos era a Emily.
Ray, antes que qualquer um pudesse protestar, foi até a porta e puxou a manivela.
- O que foi? – perguntou Johnny.
- Não consigo abrir. Parece que tem algo prensando a porta. Se pelo menos pudéssemos passar um de nós para o lado de dentro, aposto que conseguiríamos entrar por aqui.
- Bem, deixa isso comigo. Invasão de propriedade privada é comigo mesmo! – comentou Johnny com um sorrisinho malandro. Ashley apenas virou a cara.
Após dizer isso, Johnny, com uma destreza impressionante, escalou rápido e cuidadosamente uma grande árvore que havia ao lado da casa. Rastejou por um galho até se aproximar o suficiente de uma calha velha e enferrujada que descia do teto. Se jogou e apanhou a calha, que fez um barulho esquisito e pendeu pra um dos lados.
- Cuidado! – gritou Claire. Todos nós quase arremessamos o coração pela boca quando aquele ferro ameaçou cair, mas apenas entortou um pouco e Johnny, sem mais empecilhos, escalou a calha até a janela do andar de cima que estava entreaberta e se esgueirou para dentro do casarão.
- Este garoto é idiota, por acaso? Se ele caísse dessa altura, poderia até quebrar a coluna – reclamou Ashley.
- Não fale assim do cara. Ele é muito corajoso. Ta fazendo isso pela gente – respondeu Ray com aquele sorriso idiota de sempre.
- Precisamos nos apressar. Os vizinhos logo vão perceber que tem algo estranho acontecendo aqui – disse Emily. Ela tava certa e eu também tava morrendo de preocupação com isso. Imagine só se chamassem a polícia? Era só o que faltava.
Esperamos até que Johnny desse algum sinal se vida. Depois de esperar alguns minutos, escutamos alguns barulhos estranhos que pareciam vir do lado de dentro da porta. Claire estava branca de medo. Não é à toa. Imagina só, a pop star do momento, presa por invasão de propriedade privada?
- Johnny, é vc? – perguntou Ray.
Nenhuma resposta. A porta só se abriu lenta e misteriosamente, fazendo um ruído típico de porta de mansão mal assombrada. Estávamos do lado de dentro, mas havia um problema.
- Gente, cadê o Johnny? – perguntou Claire.
- Não está em nenhum lugar que eu possa ver. Olhem só, devia ser isto que trancava a porta – disse Ray, abaixando-se para pegar do chão, ao pé da porta, um pé-de-cabra todo enferrujado. O trinco era antigo e tinha aquelas aberturas pra encaixar algo que prenda a porta à parede.
- Se Johnny não está aqui, acho que podemos concluir que não foi ele quem abriu esta porta para nós – disse Emily de forma bastante calma.
- Mas se não foi o Johnny, então quem foi que nos deixou entrar? – perguntou Ray de forma entrecortada. A pobre Claire empalideceu mais ainda.
- Ai gente, vamos embora daqui! Este lugar me dá arrepios.
- Não podemos sair agora. Não sem antes encontrar o Johnny – respondeu Emily.
- Ora, façam-me o favor, não sejam ridículos! É obvio que ele, como o bobalhão que é, está querendo nos pregar uma bela duma peça – disse Ashley de braços cruzados e aquela habitual carinha de nojo.
- A Emily tem razão, vamos nessa – confirmou Ray.
A porta de entrada dava direto a um salão grande, com poucos móveis como um sofá velho e alguns quadros idiotas de gente velha. Havia uma entrada à nossa esquerda que dava pra uma cozinha suja e abandonada que devia estar cheia de ratos e à nossa direita havia uma porta grande que estava fechada, sem contar que à nossa frente havia um lance de escadarias que parecia que se desintegraria a qualquer momento.
- Johnny provavelmente ainda está no andar de cima – comentou Emily.
- Quem sabe? É melhor não arriscar. Essas escadas não me parecem a coisa mais confiável do mundo... – falei.
- Mas e quanto ao Johnny? E se ele estiver lá em cima? Estou preocupada com ele – disse Claire.
- Eu não subo essas escadas idiotas de jeito nenhum! O Johnny que se vire. Não é ele o senhor “experiente em invasão de propriedade privada”? – falei fazendo as aspas com os dedos.
- O que há com vc, seu babaca? Não se preocupa com o seu amigo? Vc é mais egoísta que eu pensava. Não é a “amizade” tua virtude? – me respondeu a Ashley de forma grosseira, também fazendo as suas aspas com os dedos. Mas droga, não era ela mesma quem desprezava o Johnny? Não era ela mesma quem acabava de dizer que ele, provavelmente, estava planejando uma emboscada pra gente? Resolvi me calar. Até que o bobalhão do Ray teve uma idéia genial:
- Já sei galera: vamos nos separar!
Aquilo só podia ser brincadeira.
- Separar o caramba! Vc ta pensando que isso é um capítulo do Scooby-Doo? – perguntei revoltado.
- Huahuaa... Calma Max. Era só uma brincadeira!
- Gente, vamos logo. To com um mau presse... – dizia Claire, até ser interrompida por um:
- BAAAHHHHHH!
Era uma coisa branca e flutuante que se aproximou aos poucos enquanto estivemos ocupados discutindo. A coitada da garota quase teve um tréco. Ray se apressou em tomar o pé-de-cabra que pegou do chão e brandi-lo contra o suposto fantasma, mas antes que pudesse acertá-lo, o ser desconhecido riu de uma forma familiar para, então, se revelar. Era apenas Johnny coberto por um lençol branco. O idiota ria de uma forma toda fanfarrona.
- Hauhauha... Cara, isso foi demais! Vcs precisavam ter visto suas próprias caras. Foi hilário, huahuaa...
- Droga, seu inútil. Veja só o que vc fez com a garota aqui? – disse Ashley apontando pra Claire, que estava pálida como um fantasma.
- É, Johnny, isso não teve graça! – reclamou a garota.
- Ah, qual é galera? Vão me dizer que tão com medo dessa casa? Porque se for isso... – dizia Johnny, até ser interrompido mais uma vez.
- Quem está ai? – gritou uma voz desconhecida.
Da escada descia nada menos que um velho decrépito, vestindo ceroulas vermelhas, um capacete do exército, pantufas, uns óculos fundo de garrafa e apontando para nós uma espingarda. Aquilo só podia ser sacanagem. Claire deu um grito e se abraçou com toda a força ao Ray. Droga, por que ele? Eu estava até mais perto dela do que o cara. Isso gerou um olhar assassino de Ashley direcionado à menina medrosa. Não sei do que ela deveria ter mais medo: se do fantasma ou da nossa terrível presidente do grêmio estudantil. Ray apenas abraçou Claire com um dos braços e com o outro brandiu seu fiel pé-de-cabra contra o velho esquisito. Emily e Ben apenas observavam a situação enquanto eu estava paralisado de medo. É claro que nunca contei isso a ninguém, mas aquela foi outra situação em que quase molhei minhas calças. No entanto, a reação mais inesperada foi, de longe, a do Johnny, que se encolhia e gritava:
- É o fantasma do velho McCain! O cara tem uma espingarda! Salve-se quem puder! Ele vai nos matar. Ele vai nos matar! – e se arremessou para trás do sofá com a mesma destreza e rapidez com que escalou aquela maldita casa. Droga, aquele era o valentão que fazia os alunos de nossa escola ter pesadelos? O cara não passava de um frangote quando o assunto era o sobrenatural. O velho começou a gritar histericamente:
- Malditos vietcongs! Procurando emboscar o velho McCain, não é? É melhor que pensem duas vezes, seus filhos da mãe, pois este ianque aqui dorme com um olho fechado e o outro aberto. Saibam que estão lidando com um veterano, seus malditos comunistas!
O fantasma maluco gritava apontando aquela espingarda pra tudo o que é lado. A pobre Claire só chorava e dizia:
- Desculpe! Desculpe! Por favor, não nos mate. Nós vamos embora, por favor! A gente promete que nunca mais volta aqui. Deixa a gente ir embora, por favor!
Johnny continuava atrás do sofá gritando:
- O velho tem uma arma. Ele vai nos matar! Ele vai nos matar!
Aquela era, sem duvida, uma situação horrível. Eu tentava dizer alguma coisa, mas estava completamente paralisado. Pensei em correr e deixar todo mundo pra trás, mas minhas pernas endureceram. Foi quando Emily, que, até o presente momento, não havia esboçado expressão alguma, dá um passo a frente e começa a falar daquela forma calma de sempre:
- Sentimos muito por incomodar seu sono eterno, fantasma do velho McCain, mas o assunto que viemos tratar é de grande importância para todos os seres da Terra, incluindo os seres espirituais. Fontes seguras nos revelaram que, no ano de 2020, seres alienígenas com poderes psíquicos invadirão nosso planeta através de um portal interdimensional que se abrirá graças ao alinhamento dos planetas de nossa galáxia. Os únicos que podem evitar isto somos nós, os Escolhidos. O fato é que precisamos de um quartel general, e estamos convocando o senhor para nossa empreitada. Precisamos da sua casa para isso. Espero que compreenda esta situação. É uma guerra e o destino da Terra está em jogo.
A Emily falou toda aquela bobagem pro velho. Todos nós, os demais Escolhidos, trocávamos olhares assustados. Aquilo não podia dar certo. Com certeza seria o nosso fim. O velho encarava Emily e apontava para ela sua espingarda trêmula devido aos braços velhos. A garota não titubeia e mantém a mesma expressão indiferente. Até que o velho abaixa a espingarda (que mais tarde descobriríamos que nem ao menos funcionava), estala os dedos e diz:
- Esses malditos vietcongs! Não é à toa que ganharam a guerra. Eu sempre soube que estavam de conluio com os marcianos. Aqueles alienígenas filhos da mãe! Malditos bolcheviques!
Ficamos absolutamente boquiabertos. Aquilo não podia ser verdade.
- Mas será possível que vcs não percebem? Isso não é fantasma porcaria nenhuma. É só um velho gagá – disse Ashley revoltada.
Os caras só podiam tá de sacanagem pra cima de mim.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Infância

http://www.youtube.com/watch?v=nvmoPhvmDp4

recomendo ouvir lendo uma de minhas poesias =)

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Espiral

Aprenda a fazer amizades rápido
As pessoas passam
Conheço uma garota cujo pai se apaixonou
E a madrasta se tornou a nova mãe
O coração de uma família mutante
Ela disse: “tenha bons filhos, pois não sou mais sua”.
Foi morar com a mãe
O problema: ela sempre odiou a mãe
Mas não mais que a madrasta
Se tornou uma solitária
Conheço um cara que tinha muitos amigos
Eram cem ou duzentos
Pouco tempo... Nenhum deles perdurou
Conheço também alguém
Um cara que não era feio nem bonito
Mas era inteligente e queria demais
Corações dados por mentes demasiado esclarecidas
Ele queria a beleza. Era seu direito.
Acabou sozinho.
Há também um homem que ficou velho cedo demais
Sentenciado a mais vinte anos arrastados com a barriga
Todos os seus amados já morreram.
É uma idade difícil. Até mesmo para o suicídio.
Eu conheço muita gente
Tenho medo da solidão. Eis o porquê deste discurso.
Conheço muita gente porque não quero ficar só
Todos passam. Sorte que aprendi a amar rápido.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O fim do mundo, cap. 13

Eu e Emily estávamos a caminho da casa do Ben. Aquilo era mesmo um saco. O gordo tava gripado e faltou quase uma semana inteira de aula. Aí eu, que era o mais próximo que ele tinha de um amigo, fui escolhido pela Srta. Smith para levar as tarefas semanais até sua casa. Por que Emily estava comigo? Não tenho a mínima idéia. Ela me abordou na saída da aula e perguntou se não poderia me acompanhar, pois queria fazer uma visita ao nosso amigo doente. Vai entender a estranha. Por que alguém poderia querer ir à casa do Ben sem ser obrigado a isso? Eu e o Gordo somos amigos (se é que se pode chamar assim) de infância e lembro bem das suas festinhas de aniversário horríveis e das tardes de verão naquela casa abafada. Era uma droga, sem falar que a família dele sempre me deprimiu; lá vivia o pai, a mãe e os quatro irmãos do Ben, que era o do meio, e eram todos gordos. Sem brincadeira, eram TODOS GORDOS. Por que é que pais gordos têm sempre que ter filhos gordos? Pensando bem, a mãe do cara vivia oferecendo comida pras visitas, e era sempre sanduíche, pizza, cachorro quente... Nunca nada muito nutritivo. Bem, até ai sem problema, não gosto de comida nutritiva mesmo, mas os cinco irmãos obesos comiam tudo com uma voracidade que sempre me espantou. Um sanduíche atrás do outro. É assim desde quando éramos crianças e aquilo sempre me deu nojo.
Chegamos até o portão da casa. Tinha uma cerca de arame que dava pra um grande terreno que poderia ser um jardim, mas era só um matagal, e lá no fundo tava a casa modesta dos gordos. Batemos na campainha, mas ela não funcionava. Aquela campainha, diga-se de passagem, nunca funcionou. Por que aquela droga de família não tirava aquela droga de interruptor do portão se a campainha jamais funcionou? É só pra enfeite? A gente resolveu bater palmas e chamar pelo nome do Ben. Depois de um tempo, sai a mãe do cara de dentro da casa e atravessa o matagal até o portão. Ela continuava a mesma, gorda e sorridente, com aquela cara oleosa, amarelada pela fritura das batatas-fritas que vivia fazendo. Aquela mulher sempre me deu vontade de vomitar.
- Max, é vc? Há quanto tempo! Que bom que apareceu, o Benjamim está de cama por causa de uma gripe muito forte. E quem é a sua amiguinha? – disse a velha sorridente. Argh!
- Bom dia Sra. Watchosk. Essa é Emily e estuda com a gente. Nós viemos trazer as tarefas de casa do Ben.
- Ah sim. Entrem! Só, por favor, não reparem a bagunça!
Passamos pelo portão e, acompanhados da tiazinha gorda, atravessamos aquele matagal idiota. Por que ninguém nunca cortava aquela grama? Seriam todos tão gordos que mal conseguiam fazer um trabalho braçal tão simples quanto esse? A Emily apenas observava tudo em silêncio e andava logo atrás de mim. Chegamos à porta da casa e a Sra. Watchosk disse:
- Vamos entrando. Por favor, será que vcs podiam tirar os calçados? Eu acabei de limpar o piso e nosso jardim suja muito os sapatos.
Emily e eu tiramos os tênis e ficamos só de meia. Droga, eu odeio tirar o tênis pra entrar na casa dos outros, sem falar que aquela casa era sempre imunda, então por que se dar ao trabalho de tirar o calçado? A tiazinha nos levou à sala de estar. A decoração daquela casa era horrível. A família era de uma religião bem ortodoxa e enchiam as paredes e os móveis com quadros e imagens de santos. Todas aquelas estatuazinhas sujas e aqueles quadros porcos me deprimiam desde as primeiras visitas àquele lugar, durante a minha infância. Mal entramos e quase fomos atropelados pelas irmãzinhas do Ben, que corriam pela casa. Eram duas meninas gordinhas e alegres que brincavam de pega-pega. Tinha mais um irmão de colo, que ficava num berço perto da cozinha. Aquelas crianças cheiravam a vômito. Por que criança pequena sempre cheira mal?
- Benjamim está repousando no quarto. Podem ir até lá entregar as tarefas enquanto eu preparo uns sanduíches pra vcs. – falou a tiazinha toda faceira.
- Ta, obrigado Sra. Watchosk.
Chegamos ao quarto. Como eu tava com uma garota, resolvi bater na porta antes de entrar. Vai que o gordo estivesse só de cueca? Bati e escutei um “entre” bastante abafado. O quarto continuava o mesmo de sempre, com aqueles móveis antigos e as paredes forradas de quadros de Jesus e pôsteres do Capitão América, do Homem Aranha, de carros esportivos ou algo que o valha. O gordo estava só de regata e cueca samba-canção. Droga, ele achava que aquela cueca em forma de short era uma roupa apresentável pra recebeu uma garota no quarto? Bem, não fazia muita diferença. A Emily não era do tipo que se importava muito com isso.
- O que vcs tão fazendo aqui? – perguntou Ben todo desconfiado.
- A gente veio te entregar a faixa de Miss Simpatia. Parabéns!
O gordo continuou a me olhar com uma cara de “O quê? Miss simpatia? Eu?”.
- To sendo irônico, droga. Isso é jeito de falar com as visitas? Pra tua informação, eu vim aqui só pra te entregar essas tarefas da Srta. Smith e a Emily veio por que tava preocupada com vc e queria saber como vc tava. Isso é jeito de tratar a garota preocupada com a tua saúde?
O cara mandou aquele olhar habitual pra Emily, que devia conter uma mensagem do tipo “desculpe”. Entreguei as tarefas e expliquei o que ele tinha que fazer. O cara era lento e não conseguia compreender nada.
- Então aqui eu aplico a fórmula né?
- Não, besta! Já te disse que é depois da equação. Vc é burro por acaso?
- Droga Max, se for pra me xingar, por que não vai embora?
- E eu vou mesmo. – falei, já tomando meu caminho para a porta do quarto, quando Emily disse:
- Espera Max. Por que vc não espera a Sra. Watchosk trazer os sanduíches pra explicar essas coisas difíceis pro Ben?
- Sanduíches?? – perguntou o gordo todo animado.
- Sim, a tua mãe disse que logo nos traria um lanche. Aposto que vc pode resolver essas equações sem problemas se estiver mastigando alguma coisa.
Foi só ela falar que a porta bateu e a mãe do Ben falou “Crianças, trouxe sanduíches!”.
Eu odeio quando me chamam de criança. Todos nós já tínhamos quinze anos, mas aquela tiazinha gorda nunca entenderia a diferença entre um adolescente e uma criança. Ela entrou com uma bandeja cheia de hambúrgueres gordurosos e o gordo saltou da cama pra abocanhar o primeiro. Aquilo era nojento.
- Ei Ben, por que não tenta fazer as tarefas enquanto come?
O Ben mandou um olhar de repúdio pra pobre Emily e disse:
- Ta na hora de comer. Depois eu faço as tarefas.
A garota continuava com aquela cara indiferente de sempre. Até que se levantou da cadeira em que sentava e caminhou lentamente até o gordo dizendo:
- Aposto que vc conseguirá entender tudo rapidinho. Não quer nem ao menos tentar? Eu posso te ajudar com as tarefas – disse a garota, sentando ao seu lado na cama. Aquela situação me parecia bastante familiar. Reparei que ela encostava levemente sua perna na perna dele e ficava com o rosto bem próximo ao dele. Aposto que o gordo podia até sentir a respiração da garota. Droga, o que significava aquilo?
- T-Ta bem, vou tentar – balbuciou o Ben.
Emily pos o caderno sobre suas pernas – a dela e a dele – e, com um lápis em mãos, começou a explicar a aplicação da fórmula enquanto o cara comia o sanduíche desesperadamente, mastigando e fazendo barulhos esquisitos.
- Espera, não é aí que vc usa a fórmula. Droga, Ben. Já não te falei isso? – reclamei.
- Vc ta errado. A formula é aqui sim – protestou o gordo de boca cheia. Quase voou pedaço de carne em mim.
- O quê???
- Ele ta certo, Max. Olha só: o resultado que ele encontrou é o mesmo que a professora passou. Acho que é vc quem ta respondendo a equação errado – disse a Emily. Ah ta, era só o que faltava!
A garota se virou pra Ben. Os dois se olharam de forma meio suspeita, ela com seus olhões azuis e ele mastigando um resto de sanduíche.
- Viu? Eu sabia que vc conseguiria! – disse a Emily com aquele seu raro sorriso, sem mostrar os dentes. A garota parecia tão gentil. Droga. Aquele gordo não merecia um tratamento desses!
- Legal. Vamos fazer este outro exercício aqui! – disse Ben todo animadinho com a nova descoberta.
- Não. Agora que vc aprendeu, pode fazê-lo sozinho mais tarde. Agora, eu gostaria que vc mostrasse aquilo que me falou – disse Emily. Fiquei boiando.
- Aquilo o quê? - perguntei.
- Vc logo verá – respondeu a garota. Droga, eu sempre odiei quando ela bancava a misteriosa. Aposto que devia ser uma coisa absolutamente idiota.
O gordo levantou da cama, abriu o guarda-roupa e pediu licença pra poder se trocar.
- A gente vai sair? – perguntei.
- Sim. O Ben vai nos mostrar um lugar perto daqui.
Eu devia saber que a Emily não tava visitando o doente à toa. Ela sempre tem seus motivos, como explorar um lugar secreto ou buscar informações sobre alienígenas. Esperamos do lado de fora do quarto até que o Ben saiu, desta vez com roupas descentes. Fomos até a sala de estar que era caminho para a saída e nos deparamos com o pai e o irmão mais velho de Ben que acabavam de voltar da oficina. O pai do cara era igualzinho a ele, gordo e taciturno, mas usava um macacão azul, sujo de graxa e com seu nome costurado no peito. Os dois trabalhavam na oficina da família e voltavam sempre com as caras sujas de graxa. Aquilo era mais uma coisa nojenta na família. Os dois mal nos cumprimentaram e foram direto pra sala de televisão, se jogaram no sofá já manchado da mesma graxa de sempre e ficaram lá, até que o Sr. Watchosk gritou pro Ben:
- Ei garoto, me alcança o controle da televisão ali na estante!
O Ben se locomoveu da sala de estar até a de televisão só pra alcançar o controle pro pai, que devia ta a poucos metros do próprio. Eram todos uns porcos preguiçosos. Depois disso resolvemos sair daquela casa antes que o coitado tivesse que buscar algo na geladeira ou coisa assim. Fomos abordados pela Sra. Watchosk:
- Benjamim, o que está fazendo? Vcs vão sair? Mas vc está muito doente!
- Tudo bem, mãe. Só vou até a esquina com eles e volto logo.
- Ta bem, querido, mas não venha tarde.
A tiazinha fez uma benção pro gordo. Benção pra que? Não é como se alguma coisa muito trágica pudesse ocorrer no caminho até a esquina. Antes que pudéssemos sair, o paizão gordo grita mais uma vez:
- Benjamim! Se for sair, passe na loja de conveniências e me traga uma cerveja.
- Ta bom pai! – respondeu o gordo.
Viver naquela casa devia ser uma droga, principalmente quando você era o filho do meio como o Ben. Saímos e andamos. Um pouco mais que uma esquina, até que chegamos ao nosso terrível destino.
- É aqui – disse Ben – o lugar ta abandonado há muito tempo.
- Bem... Parece legal. Este pode ser o primeiro quartel general dos Escolhidos – disse Emily.
- O quê??? – perguntei boquiaberto.
Fazia dias que a Emily falava que nós, os Escolhidos, precisávamos de um lugar secreto para fazer aquelas reuniões idiotas sobre alienígenas e toda essa palhaçada. Toda vez que ela falava deste lugar, usava uma definição diferente. As mais populares eram “quartel general”, “base” e “esconderijo”. Até aí tudo bem, mas aquilo era demais! Estávamos em frente a nada menos que o casarão do velho McCain. Um lugar folclórico na nossa cidade, abandonado há muito tempo, que se dizia ser mal-assombrado. Ninguém tinha coragem de entrar em um lugar como aquele, muito menos eu.
- Vcs só podem ta de brincadeira né? Ninguém vai aceitar entrar num lugar desses! O que deu em vcs? – perguntei desesperado.
- Bem, eu acho que é um bom lugar. Amanhã é sábado e podemos combinar de nos encontrarmos aqui em frente durante o dia pra que possamos explorar o casarão por dentro e avaliar se é mesmo uma boa base para nós – falou Emily.
Aquilo não me cheirava bem. Tava na cara que alguma coisa não sairia certo.